Arles: festival festeja 50 anos promovendo a fotografia como arte
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O festival Encontros de Arles, no sul da França, festeja em 2019 meio século de engajamento pela divulgação da arte da fotografia. O evento é uma história bem-sucedida de camaradagem, paixão pela imagem e dedicação. Para comemorar a data, exposições especiais e retrospectivas fazem parte do extenso programa.
Enviada especial a Arles
Tudo começou com três amigos – o fotógrafo Lucien Clergue, o conservador Jean-Maurice Rouquette e o escritor Michel Tournier. Eles se deram conta que a fotografia não era bem representada na França e decidiram organizar um encontro em Arles, pequena cidade no sul da França, conhecida por seu tesouro romano (arena, teatro e casa de banho) e medieval, além de ter sido ponto de parada e inspiração de artistas como Vincent Van Gogh e Pablo Picasso, este último fã incondicional de touradas, que até hoje acontecem em Arles e região.
O primeiro festival foi um sucesso: três fotógrafos convidados e público de 200 pessoas. Meio século depois, Arles se tornou obrigatória no calendário da fotografia mundial. Este ano estão programadas mais de 50 exposições – a grande parte fica em cartaz três meses. Para se ter uma ideia do público, um novo recorde foi batido em 2018, com 140 mil visitantes.
Muita história para mostrar
A exposição “Toute une histoire!” (Toda uma história) buscou no acervo do festival obras significativas de todos os artistas que já passaram pelos Encontros, além de imagens de bastidores e cartazes originais. O percurso do festival e as imagens da mostra estão no livro “Arles, les Rencontres de la photographie : 50 ans d’histoire”, de Françoise Denoyelle.
Perto do litoral e de uma rica região de fauna e flora – a Camargue – a cidade de Arles vira um formigueiro de turistas e fotógrafos amadores durante todo o verão. Na semana de abertura, fotógrafos (ainda) anônimos ou pouco conhecidos, participam do percurso “off”, ou simplesmente usam as paredes da cidade como local de exposição efêmera.
A maturidade do festival se reflete também na organização. Um passe pessoal de €35 dá acesso a todas as exposições. Um mapa distribuído em todos os pontos traz informações práticas de todas as mostras e eventos paralelos. O aplicativo também pode ser baixado gratuitamente. Difícil é escolher o que ver, principalmente se o tempo é curto.
Mulheres armadas de câmeras
Entre as preciosidades, está uma aguardada retrospectiva no espaço Van Gogh da americana Helen Levitt (1913-2009), pioneira da fotografia de rua, de documentários e da cor. A cidade de Nova York foi o seu cenário. Ela captou o cotidiano de crianças, de adultos, de passageiros no metrô, da pobreza. Uma mestra que demorou para ser reconhecida.
Outras três grandes fotógrafas americanas expõem lado a lado, em “Unretouched Women” (Mulheres sem retoques), no mesmo espaço Van Gogh: Eve Arnold (1912-2012), Abigail Heyman (1942-2013) e Susan Meiselas. As imagens retratam mulheres conhecidas (como Marilyn Monroe, Elizabeth Taylor ou Joan Crawford) ou anônimas, pegas quase de surpresa. Susan Meiselas, 71 anos, ativa como nunca, vai ter uma retrospectiva no Instituto Moreira Salles (São Paulo), de 15/10/19 a 16/02/20, a mesma que já passou por Paris.
De Marselha ao Rio em 1942
A raridade este ano é por conta da alemã Germaine Krull (1897-1985), que fotografou uma viagem de navio de Marselha ao Rio, em 1942. Entre os outros passageiros estavam o cineasta Jacques Rémy, o poeta e escritor André Breton e o antropólogo Claude Lévi-Strauss. As imagens raras mostram a velha Marselha, Casablanca, Martinica, Guiana (para onde eram mandados os condenados franceses), Bahia e Rio. As fotografias, que se pensavam perdidas, foram encontradas pelo cineasta Olivier Assayas, filho de Jacques Rémy. Krull ficou um ano no Brasil, onde também fez fotos de Ouro Preto para uma publicação esgotada.
Brasil hoje
O Brasil tem destaque na exposição “What’s going on...”, na Fundação Manuel-Rivera Ortiz. Doze artistas do coletivo Iandé refletem sobre a situação atual no país. Shinji Nagabe, que faz parte do grupo, também foi um dos finalistas para o prêmio Descoberta de Arles, com a série "República das Bananas".
Memórias technicolor
Uma exposição para se ver sorrindo é “ The Anonymous Project” (O projeto anônimo), que ocupa uma casa inteira - local que faz parte do circuito de exposições todos os anos. Desta vez, a casa tem decoração e mobília de classe média americana dos anos 1950. As imagens fazem parte de slides anônimos descobertos pelo cineasta Lee Shulman e que mostram uma América de cores vibrantes e feliz.
Sexo e liberdade em Praga
A tcheca Libuše Jarcovjáková ocupa o privilegiado espaço da igreja Sainte-Anne. Em branco e preto, sem pudor e sem amarras, ela traz um impressionante relato de suas experiências pessoais em Praga, tendo como pano de fundo o regime socialista da época. Sexo e bebidas fazem parte do cardápio.
O festival Encontros de Arles acontece até 22 de setembro.
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