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Afinal, quem ganhou a Segunda Guerra Mundial?

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Para você, quem é o vencedor do regime nazista na Segunda Guerra Mundial: soviéticos ou americanos? Setenta anos depois do fim do maior conflito da história, a resposta mudou na cabeça dos europeus. Em 1945, a maioria deles creditava a derrota do 3º Reich à União Soviética. Hoje, a opinião se inverteu.

Tropas soviéticas nas portas de Berlim.
Tropas soviéticas nas portas de Berlim. Wikipédia
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O mais antigo instituto de pesquisas francês, o Ifop, faz regularmente essa pergunta aos franceses desde a década de 1990. Neste ano, 54% responderam que os Estados Unidos foram os principais responsáveis pela vitória dos Aliados. Há 70 anos, era o oposto: 57% achavam que eram os soldados do Exército Vermelho - os primeiros a chegar a Berlim - e apenas 20% atribuíam a conquista aos americanos.

A situação é semelhante em outros países protagonistas da guerra. O instituto britânico ICM Research mostrou que apenas 13% dos franceses, alemães e britânicos consideram os russos os maiores vitoriosos. Os especialistas indicam que essa mudança de posicionamento é um resquício da Guerra Fria.

“Evidentemente, a Guerra Fria gerou um recuo da influência soviética na Europa ocidental. A importância do Partido Comunista francês também regrediu nos anos 1980. Ao mesmo tempo, ocorreu uma ‘americanização’ da cultura ocidental, da qual a França não escapou. Com isso, os Estados Unidos se impuseram não apenas no imaginário popular, como sendo os principais vencedores, mas também sob o ponto de vista político”, explica Jean-Philippe Dubrulle, do departamento de Opinião do Ifop. “Foi apenas no governo de François Mitterrand que a França começou a celebrar o aniversário do Desembarque aliado na Normandia. E com o tempo, as pessoas assimilaram o Desembarque como sendo a causa direta da libertação da França.”

Nestes 70 anos, a influência americana levou o oeste europeu a enxergar a história com outros olhos. Mas para o historiador Claude Quétel, autor de A Segunda Guerra Mundial, não restam dúvidas: desde que perdeu a batalha de Stalingrado, o regime de Hitler já estava fadado ao fracasso.

“Quem mais ajudou a derrubar e o principal vencedor do Terceiro Reich nazista é o Exército Vermelho. É uma evidência total. A União Soviética teria ganho de qualquer maneira”, sublinha. “Quando vemos o quanto o Terceiro Reich resistiu até os últimos momentos, constatamos que é certo que a ofensiva dos Aliados no oeste europeu, a partir da França, encurtou a guerra e poupou vidas. Mas ainda assim, é preciso sublinhar que a guerra já estava ganha ao leste pelo Exército Vermelho.”

Mortes de soldados

O especialista destaca o peso dos números de soldados mortos de cada lado, um sinal do engajamento das potências no conflito: a União Soviética perdeu cerca de 10 milhões de militares, contra 416 mil soldados dos Estados Unidos - que só entraram no front europeu em 1944. A historiadora Virginie Sansico, autora de La Justice Deshonorée 1940-1944 (A Justiça Desonrada de 1940 a 1944, em tradução livre), observa que, logo após a guerra, o governo do general Charles de Gaulle até subestimava a relevância dos americanos no confronto.

“O general De Gaulle era muito anti-americano. Ele chegou a retirar a França do comando militar da Otan em 1966. Ele não queria que a França recebesse influência americana, por isso não fez nada para reforçar a ideia de que os Estados Unidos tiveram um papel crucial na guerra”, explica. “De Gaulle estimulou essa ‘apagada’ do papel dos americanos na França, o que também foi injusto, porque a libertação do território francês se deve, antes de mais nada, ao Desembarque Aliado.”

Influência do cinema

Os mais jovens são os mais sensíveis à mudança de opinião sobre o protagonismo da vitória sobre o nazismo: 59% dos franceses de 18 a 35 anos acham que os principais vencedores foram os Estados Unidos, contra 52% entre o público com uma idade superior. Quétel ressalta a importância da indústria cultural americana para fortalecer essa imagem, ao inundar a Europa com filmes, documentários e livros sobre o desempenho do país na Segunda Guerra.

“O que os francesinhos, como eu, assistiam no cinema na época? Filmes americanos. Ninguém olhava sequer o início de um filme soviético”, lembra. “É claro que, com igual fervor, o cinema soviético contava a história da Grande Guerra Patriótica, mas francês nenhum assistia a esses filmes. A França só prestava atenção na extraordinária máquina hollywoodiana do cinema americano”, afirma.

Ausência em Moscou

Os historiadores lamentam que os líderes ocidentais tenham se recusado a participar das comemorações dos 70 anos do fim da guerra em Moscou, neste sábado. Para eles, a história não deveria se misturar ao contexto geopolítico tenso, gerado pela crise na Ucrânia.
 

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