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Guerra na Ucrânia: jogadores de futsal brasileiros deixam Kiev para começar nova vida

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Assim como muitos ucranianos, os jogadores de futsal brasileiros Moreno Santiago, 30 anos, e Matheus Ramires, de 26, que moravam e trabalhavam na capital da Ucrânia, Kiev, tiveram que deixar o país após o início da guerra, em 24 de fevereiro. Após três tentativas, eles conseguiram escapar em um comboio de carros organizado pela Embaixada do Brasil que os levou à Polônia. De Varsóvia, cada um seguiu o seu caminho. 

Jonatan Bruno Santiago, conhecido como Moreno(esquerda).
Jonatan Bruno Santiago, conhecido como Moreno(esquerda). © Arquivo pessoal
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Por Paloma Varón

Matheus Ramires havia trocado o ASEC de Caruaru pelo Skyup de Kiev, onde começou a jogar no dia 1º de fevereiro. Ele nunca poderia imaginar que sua jornada na Ucrânia duraria apenas um mês, parte dela tentando escapar do país.

O jogador do time ucraniano Skyup, que chegou a ficar horas escondido em um bunker de Kiev antes de deixar a capital, conseguiu cruzar a fronteira polonesa no dia 4 de março com um grupo de brasileiros, entre eles o amigo Moreno Santiago. Eles chegaram à capital polonesa, Varsóvia, onde se separaram.

Ramires voltou para o Brasil no voo da FAB que deixou Varsóvia em 9 de março e, após três escalas, chegou a Brasília no dia 10. O voo de repatriação tinha 70 pessoas.

"Tentamos sair de Kiev três vezes de trem e não conseguimos. Em alguns momentos eu achei que seria muito difícil deixar a cidade, quase que impossível, mas apareceu ima ligação do embaixador e fomos num comboio de três carros para Lviv, uma viagem bem cansativa, mas que deu tudo certo. Ficamos dois dias em Lviv e entramos na Polônia escoltados pela Policia ucraniana. A fronteira estava lotada e sem isso seria muito difícil", conta Ramires. 

"A chegada na Polônia foi em um comboio de carros, graças à Embaixada. Na fronteira, tivemos um auxilio muito bom dos voluntários que estão fazendo um trabalho incrível, nos deram sopa, chá, foi bem legal ver o que eles estão fazendo pelos refugiados, que estão passando a fronteira a pé", completa Santiago, sobre a jornada para deixar Kiev. 

Ao chegarem à capital polaca, Varsóvia, o destino dos brasileiros se bifurcou. Ramires decidiu voltar e Santiago, ficar.  "Na Polônia, a embaixada nos colocou num hotel até a saída do voo da FAB. Eu decidi ficar por aqui porque já tenho bastante tempo na Europa e para mim é mais fácil arranjar um clube por aqui", relata Moreno. 

Moreno Santiago, que no Brasil jogou em dois times, em Jaraguá do Sul e no Corínthians, já está fora do Brasil há 11 anos. Ele também já jogou no Dínamo, de Moscou, e no Uktha, na cidade russa de mesmo nome.

“Eu já morava há nove anos aqui no Leste Europeu, estou triste de ver dois povos irmãos lutando um contra o outro”, diz o jogador, que, quando foi para Kiev, deixou uma filha de 5 anos e uma ex-mulher em Moscou.

Amizade recente que se fortaleceu com a guerra

Os dois atletas brasileiros se conheceram faz pouco tempo, mas esta amizade recente se fortaleceu com os dias que passaram juntos, escapando da guerra. 

"Eu conheci o Ramires através de um empresário que o indicou para jogar na minha equipe. Ele veio e ficou só um mês no meu time, e voltou, mas a gente criou uma amizade que vai ficar para a vida inteira", diz Santiago. 

"Vê-lo voltando para o Brasil foi, por um lado, satisfatório, porque ele está com saúde e foi se encontrar com a família, e por outro foi triste de ficar longe de um amigo, porque criamos um laço muito forte com o que passamos nesta guerra", acrescenta. 

Para Ramires, também foi duro deixar o clube: "O Moreno é uma pessoa que me acolheu muito bem, uma amizade que se fortaleceu num momento muito difícil, é um contato que quero manter pela vida inteira. Ele é um ser humano do bem e essas pessoas assim a gente gosta de ter por perto".

Destinos diferentes

A partir daí, os brasileiros se separaram. Ramires voltou para o Brasil e Santiago está assinando contrato com outro time do leste europeu, mas ele ainda não pode revelar. 

"Meus planos a partir de agora ainda estão indefinidos. Estou acertando com uma equipe, ainda não posso dizer qual, mas não é na Polônia, vou para outro país, próximo da Polônia. Quando eu assinar o contrato posso contar mais detalhes", diz Santiago. 

Para Ramires, "a vida continua". "É um recomeço, porque muitas coisas ficaram para trás. Vou ter que trocar de clube, mas continuo trabalhando, faço isso desde os 16 anos. O futsal é o que me sustenta. Vou descansar uns dias e já voltar aos treinos até acertar numa nova equipe", conta o atleta, que está em Rio Grande (RS), com sua família.

Voltar para a Ucrânia é opção?

Sobre os planos de voltar a jogar na Ucrânia quando a guerra acabar, os amigos também têm visões diferentes.

Matheus Ramires não pensa em voltar para a Ucrânia quando a guerra acabar. “Eu já informei ao clube da minha saída, já agradeci, são pessoas maravilhosas, mas agora não voltaria, quem sabe daqui a uns anos?".

"Eu torço muito que isso acabe, a guerra é ruim para todo mundo, muitas famílias estão se perdendo, muita gente sofrendo...", continua o atleta gaúcho.

Já Moreno Santiago, que também não vê a hora que a guerra acabe, diz que voltaria sem pestanejar: "Com certeza eu pretendo voltar a jogar na Ucrânia. Eu amo a Ucrânia, amo a Rússia e para mim é muito triste ver eles guerreando entre si, porque eles são povos irmãos. Se esta guerra acabar, eu volto", afirma Santiago 

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