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"Deficiência não é um obstáculo para o sucesso", diz autor franco-brasileiro que havia sido desenganado por médicos

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Se fosse pela previsão dos médicos, Louis Mascarenhas talvez nem estivesse vivo hoje. Mas este mineiro de 20 anos lutou pela vida desde o nascimento e agora pode se considerar um vencedor. Apesar de um acidente vascular cerebral (AVC), ainda bebê, que lhe deixou sequelas, ele nunca aceitou os prognósticos de que não falaria e dificilmente andaria. E não só alcançou essas vitórias, como se tornou escritor e foi aceito na Sorbonne, uma das melhores universidades da França.

Louis Mascarenhas Conan é autor do livro Vencer (Editora Folhas de Relva).
Louis Mascarenhas Conan é autor do livro Vencer (Editora Folhas de Relva). © RFI
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No livro "Lutar", publicado pela editora Folhas de Relva, ele usa a própria trajetória como pano de fundo para denunciar o preconceito contra pessoas com deficiências.

“Essa condição de pessoa com deficiência foi difícil, principalmente na minha infância e adolescência, pois aos 7 ou 8 anos as pessoas começam a observar a diferença”, explica. “No começo foi difícil aceitar a minha condição e as críticas dos outros. Mas, ao longo da vida, eu fui aprendendo, conhecendo as pessoas certas e entendi, finalmente, que a minha deficiência não seria um obstáculo para o sucesso”, diz.

Louis Mascarenhas nunca aceitou que a deficiência física lhe impedisse de querer vencer na carreira. Ele pretende ser tradutor e para isso supera inúmeros desafios. A principal lição que o autor ensina no seu primeiro livro é não aceitar a condição de vítima, nunca alimentar o preconceito e, mais do que isso, entender que ser diferente não é um problema. “Eu não aceito a imagem de coitado. Pois todo mundo é diferente. Se todos fôssemos iguais, qual seria a graça do mundo? Eu acho que nós temos que aceitar as diferenças e nos aproveitar delas para aprendermos”, afirma.

Paixão pelo futebol

Torcedor do Atlético Mineiro, o autor compara a sua própria trajetória com a do Galo, que mesmo sem ser um time historicamente vencedor, nunca desistiu de chegar lá. “Eu não posso dizer que o Galo não é um time vencedor. Mas na época em que eu fui operado, quando eu vivi a fase mais difícil da minha vida, com operações na perna e no braço, o Galo era um time de meio de tabela. Era um time bom, mas não como vemos hoje, em 2021”, compara. “E eles ganharam a Libertadores da América, o maior campeonato do continente, sendo que todos os prognósticos diziam o contrário, que o Galo seria eliminado na primeira fase. Isso me lembra a minha vida, pois as pessoas me consideravam perdedor, que eu não conseguiria estudar e hoje eu estou aqui”.  

Numa das passagens do livro, Louis escreve que foi na torcida do Atlético que se sentiu parte da “massa” pela primeira vez e conta sobre esse sentimento de pertencimento que descobriu no estádio. “Eu lembro do primeiro jogo que eu tive a oportunidade de ver. Eu nunca tinha visto nada igual. Todo mundo junto, de diferentes classes sociais misturadas e todo mundo era atleticano”, conta.

Franco-brasileiro, de pai francês e mãe mineira, ele sempre ouviu da família que a sua força vinha, justamente, da sua diferença. “Lá em casa, costumamos falar em francês, mas vivemos nessa dualidade linguística. E isso facilitou muito para eu aprender outras línguas, como inglês e espanhol que eu falo fluentemente, algo que eu gosto muito”, diz. “Eu estava acostumado com o ritmo do colégio, mas na faculdade é tudo diferente. Na Sorbonne tem muitas nacionalidades diferentes, a responsabilidade é grande, mas os meus colegas facilitaram a integração”, comemora.  

“Aqui na França o portador de deficiência física tem algumas vantagens, como atendimento de saúde gratuito, até a fisioterapia. No Brasil eu tinha que pagar. Além disso, eu tenho mais tempo para fazer exames na escola, sala à parte, computador, o que no Brasil é mais difícil. Em Belo Horizonte, vejo muitas pessoas com deficiência que não têm oportunidades”, lamenta.

Louis Mascarenhas conta que o autoconhecimento foi determinante ao longo de todo o processo, além de esforço intelectual e físico, já que ele passou por várias cirurgias ao longo da infância e adolescência. Entretanto, mesmo tendo que enfrentar procedimentos dolorosos, ele nunca perdeu a determinação.

“Eu já pensei muitas vezes em desistir. Depois de um tempo você pensa em jogar a toalha. Mas eu tenho a chance de me tratar com um psicólogo desde os 10 anos. Eu não tenho vergonha de dizer. E isso me ajuda a perceber a deficiência de uma forma diferente. Você tem que saber lidar com ela, porque a deficiência vai conviver com você a vida toda. Mas isso não te impede de viver”, conclui.

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