Saúde em dia

Como a associação francesa "O Silêncio dos Justos", que inspirou filme, trata o autismo

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A associação francesa “O Silêncio dos Justos” é reconhecida pelo atendimento diferenciado a crianças, adolescentes e adultos com transtornos graves do espectro do autismo. Criada em 1996, a estrutura está situada em Seine-Saint-Denis, na periferia de Paris. No local, médicos, pedopsiquiatras, psicólogos e enfermeiros atendem cerca de 120 pessoas, com o objetivo de promover a inclusão escolar e profissional dos pacientes.

Ateliê da associação O Silêncio dos Justos, em Seine Saint Denis, na periferia de Paris
Ateliê da associação O Silêncio dos Justos, em Seine Saint Denis, na periferia de Paris © RFI/ Charlie Dupiot
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O trabalho feito pela associação inspirou o filme “Mais que Especiais", dos diretores franceses Olivier Nakache e Éric Toledano, que estreou no Brasil em 2021.

Nos últimos anos, algumas séries da Netflix também popularizaram essa condição, que pode se manifestar de diferentes maneiras. Uma delas é “Atypical”, que mostra o dia a dia de Sam, um adolescente que tenta levar uma vida normal apesar de suas dificuldades cotidianas.

Mas, na vida real, os desafios são bem diferentes, como mostrou a repórter da RFI Charlie Loupiot ao acompanhar o atendimento na associação francesa. A reportagem marcou o Dia Mundial sobre a Conscientização do Autismo, comemorado em 2 de abril, e foi transmitida pelo programa Priorité Santé.

O distúrbio se caracteriza por problemas de comunicação, comportamentos repetitivos, dificuldades de adaptação, de aprendizagem ou de linguagem. Alguns adolescentes atendidos no local também sofrem de doenças psiquiátricas.

Este é o caso de Clémentine, 18 anos, que é acompanhada pela pediatra Latifa Baba Aissa. “No caso da Clementine, o atendimento é mais fácil porque ela gosta de falar e consegue explicar o que a está incomodando”, explica.

 

Cartaz do filme "Mais Que Especiais", de Olivier Nakache e Eric Toledano, que se inspirou no cotidiano da associação "O Silêncio dos Justos"
Cartaz do filme "Mais Que Especiais", de Olivier Nakache e Eric Toledano, que se inspirou no cotidiano da associação "O Silêncio dos Justos" © BCGagence

 

Problemas físicos e mentais

A pediatra é responsável pelo monitoramento da saúde física dos pacientes que frequentam a associação. “Faço o exame clínico e somático, trato todas as doenças, todos os sintomas e tudo que envolve o sistema neurológico, cardiovascular, auditivo, oftalmológico, dentário, urogenital e ortopédico. Enfim, toda a saúde física da criança”, detalha.

Lidar com pacientes autistas é uma tarefa para profissionais especializados, lembra a médica francesa. As dificuldades psiquiátricas muitas vezes acabam ficando em primeiro plano no atendimento. Para os pais, às vezes é díficil obter o atendimento adequado. “Alguns médicos têm medo de atender esses pacientes. Tem um oftamologista, por exemplo, que entrou na minha lista negra: ele gritou com algumas crianças, sem levar em conta suas deficiências”, conta a médica francesa.

Epilepsia é comorbidade comum

Para amenizar esse problema, a associação criou parcerias com alguns profissionais da saúde. Tratar uma criança autista requer sensibilidade para gerenciar crises, que por vezes podem ser violentas, lembra Latifa. Muitos pacientes também são epiléticos.

“A epilepsia é, com frequência, associada ao Transtorno do Espectro Autista. Temos muitas crianças epiléticas. Há mais de 40 formas clínicas de epilepsia, e muitas vezes ela equivale a uma convulsão”, explica.

No início de 2023, a associação passou a diversificar suas atividades e abriu um centro em Seine Saint Denis, onde os adolescentes passam o dia. À noite, alguns pacientes, acompanhados por educadores, dividem apartamentos que podem receber de três a quatro jovens, em função da autonomia e capacidades de cada um. 

Muitos moram sozinhos nas mesmas residências onde vivem as equipes educativas. Entre eles, há vários jovens autistas que vivem afastados de casa por decisão da Justiça e pela Rede de Proteção à Infância francesa.

Conectar os pacientes com o mundo

A RFI entrevistou Stephane Benhamou, criador da associação e diretor de uma estrutura que organiza colônias de férias para crianças e adolescentes. Ele diz que o atendimento na associação é diferenciado e se adapta a cada criança e situação. “Desde 2010, temos médicos, uma pediatra e um psiquiatra, além de um atendimento de emergência", diz. Uma vez por mês, conta, a associação também promove passeios, na região parisiense, com atividades variadas.

"Temos muitos psicológos e educadores. Esse atendimento multidisciplinar, essas trocas, dão sentido ao acompanhamento e ao desenvolvimento. Uma criança precisa ter, como toda criança, uma vida de criança, um ambiente de criança", observa. "A única complexidade do autismo é a falta de comunicação. Então todo o trabalho que buscamos fazer com nossa equipe é de conectá-los a nosso mundo, simplesmente”, resume.

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