Avignon/Teatro

Peça de diretor africano é grito de protesto em Avignon

O congolês Dieudonné Niangouna, diretor, ator e autor de teatro, apresenta no Festival de Avignon, Shéda, um espetáculo que dura 5 horas, encenado ao ar livre numa paisagem desértica a 30 quilômetros de Avignon. A peça trata do sofrimento do continente africano e critica o mundo dito civilizado.

Shéda é encenada numa paisagem desértica a 30 quilômetros de Avignon
Shéda é encenada numa paisagem desértica a 30 quilômetros de Avignon @ Christophe Raynauld de Lage/ Festival Avignon 2013
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Assistir o espetaculo Shéda, de Dieudonné Niangouna é uma viagem que começa no inicio da noite, quando os espectadores pegam um ônibus para se dirigir a um dos palcos mais insólitos desse festival : a Carrière de Boulbon, uma pedreira escondida entre arbustos, a 30 quilômetros de Avignon. É nesse local, escutando o canto das cigarras, que assistimos uma verdadeira epopeia, com duração de quase cinco horas.

« Faroeste africano »

O diretor congolês, um dos destaques esse ano do festival, explora a paisagem desértica, típica da região de Provence no sul da França, para criar o cenário do espetáculo. A trama se passa num vilarejo qualquer da Africa, onde se encontram refugiados de todos os horizontes : vitimas da seca, soldados, guerrilheiros, prostitutas, sobreviventes…Uma terra de ninguém, um « faroeste africano » como esta peça foi chamada por alguns criticos. Aliás, no texto há muitas referências aos clássicos do cinema americano.

O espetáculo é pontuado pela música de dois instrumentistas em cena, que dão ritmo a ação de 12 atores e atrizes (entre esses o próprio Dieudonné). A peça é um um grito de protesto do diretor que vem do Congo, país que viveu 25 anos de guerra civil.

Shéda é também uma bela homenagem aos mitos e à sabedoria africana. Mas através dessa paródia de um vilarejo perdido no deserto, a peça é principalmente uma critica ao mundo dito civilizado que continua explorando o continente africano.

« A Cólera da África »

Para Dieudonné tres palavras sintetizam o espetáculo e a situação atual da África : « medo, solidão e urgência ». O autor traz à sua maneira para Avignon esse ano a « Cólera da África » que é, aliás, o título de sua primeira peça escrita em 1997. Não poupando referências à cultura ocidental, ele insiste, em todas as entrevistas dadas aqui em Avignon, que recusa a etiqueta de « autor africano » e o estigma de « curiosidade étnica ».

Rompendo barreiras culturais, o dramaturgo coloca em cena personagens em situações de perigo, personalidades « border line », mas não descarta o sonho, o único elemento que, segundo ele, permite que se aborde o futuro. Em suas peças, diz ele, “cada personagem tem direito a um futuro, mesmo passando pelos pesadelos”.

Com essa peça, Dieudonné Niangouna busca desestabilizar o espectador ao longo de 5 horas de diálogos densos entre os personagens, num cenário com clima de fim de mundo. Como bem avisou o diretor africano : « Meu trabalho procura emocionar e não simplesmente agradar ».

Shéda fica em cartaz no Festival de Avignon até 15 julho e em outubro inicia uma tournée internacional.
 

Shéda, peça do diretor africano Dieudonné Niangouna, em cartaz no Festival de Avignon
Shéda, peça do diretor africano Dieudonné Niangouna, em cartaz no Festival de Avignon

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