Morreu Teresa Mota, “uma mulher de liberdade"
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A actriz portuguesa Teresa Mota, de 82 anos, morreu no sábado, em Paris, cidade onde vivia há mais de 60 anos. Teresa Mota co-fundou, nos anos 70, com o marido Richard Demarcy, a companhia teatral “Naïf Théâtre”. O seu filho, o encenador e director do Théâtre de la Ville, Emmanuel Demarcy-Mota, descreve-a como "uma mulher de liberdade" que se pautava pela autenticidade, pelo amor à poesia e à criação.
Teresa Mota nasceu em 30 de Julho de 1940 na cidade de Tomar, onde passou a infância, e foi viver com a mãe e o irmão, João Mota [ fundador do Teatro da Comuna], para Lisboa. Aí, ficou conhecida ao protagonizar um dos primeiros programas infantis da televisão portuguesa, “As cartas do tio João (e da sua sobrinha Teresinha)”. Foi actriz do Teatro Nacional D. Maria II e, em 1961, sob a alçada de Amélia Rey-Colaço, viu reconhecida a sua interpretação em “Romeu e Julieta”, de William Shakespeare, com o Grande Prémio da Crítica. No cinema, destacou-se pelos seus papéis nos filmes “Raça” (1961), “Histórias Simples da Gente Cá do Meu Bairro” (1961) e “Meus Amigos” (1974).
Em plena ditadura, Teresa Mota trocou Portugal por França. Tinha 25 anos e tomava, simplesmente, “uma posição forte de uma mulher que sempre tentou lutar pela sua liberdade de criação, pela sua liberdade de pensamento”, recorda à RFI o filho, Emmanuel Demarcy-Mota, encenador e director do Théâtre de La Ville, em Paris.
Em 1970, já a viver na capital francesa, co-fundou, com o marido e encenador Richard Demarcy, a companhia teatral “Naïf Théâtre”, na qual durante mais de 25 anos, foi co-criadora de todos os espectáculos.
“Quando a Teresa Mota veio para França, ela conheceu o Richard Demarcy - foi o meu pai que faleceu há três anos – e fundaram a companhia Naïf Théâtre em 1970. Eles decidiram juntos – ele como francês, ela como portuguesa em França – fundar uma companhia teatral para defender a escrita contemporânea, os poetas, os autores. Foram os primeiros a encenar, em Paris, Fernando Pessoa, a ‘Ode Marítima’, nos anos 80. Ela entrou nos espectáculos todos com o meu pai e pôde representar num dos mais bonitos teatros de Paris, o Théâtre de l’Odéon, no Festival de Avignon, onde eu entrei em cena com ela, quando era criança. Lembro-me de segurar a mão da minha mãe numa noite de estrelas no festival, em 1977, na primeira peça contra o fascismo e a ditadura que o meu pai tinha escrito com ela e que também foi representada no Teatro da Comuna”, recorda Emmanuel Demarcy-Mota.
No fundo, Teresa Mota era uma "mulher de liberdade" que se pautava pela autenticidade, pelo amor à poesia e à criação. “Para mim e para nós todos, a Teresa Mota Demarcy era uma mulher de liberdade, uma força de liberdade”, descreve o filho, sublinhando, também, que se tratava de “uma grande actriz, uma actriz profunda e mística, que gostava do público, dos papéis e dos poetas”.
Teresa Mota foi, ainda, professora agregada da Sorbonne Nouvelle/Paris III, na especialidade de Língua e Teatro.
“Ela é que me ensinou a ligação à poesia profunda e ela é que sempre quis ajudar os outros porque ela também me ensinou isso. Ela decidiu ser professora, depois, na Universidade aqui em França, na Sorbonne. Ela tinha essa honra de ter voltado a fazer estudos universitários e de ensinar a língua e a cultura portuguesas, o conhecimento e o saber, para todos, para os filhos e filhas da imigração também portuguesa que viviam em França. Ela tinha uma ligação profunda e nunca numa visão vertical, mas numa visão horizontal das ligações humanas”, recorda.
Na sua vida, “a palavra mais importante era a autenticidade” e “ela faz parte desses seres humanos que conseguem conservar uma criança profunda com a curiosidade sempre autêntica na maneira de ver o mundo e os outros". Por isso, Teresa Mota fez “amizades muito reais e profundas contra um sistema burguês hipócrita”, contra o qual “ela lutou sempre”, conclui Emmanuel Demarcy-Mota que preside à Temporada Cruzada França-Portugal 2022 que agora se inicia.
Em Julho de 2018, Teresa Mota foi uma das entrevistadas do programa "Artistes portugais à Paris : une histoire orale" da delegação em Paris da Fundação Calouste Gulbenkian.
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