“O cinema brasileiro ainda é dominado por homens brancos”, diz cineasta Juliana Rojas em Berlim
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A diretora e roteirista paulista Juliana Rojas participa da 74ª edição do Festival Internacional de Cinema de Berlim com o longa “Cidade; Campo”, em competição na mostra Encounters. Em entrevista à RFI na capital alemã, ela conversou sobre a realização do filme e o estado do cinema brasileiro.
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Daniella Franco, enviada especial da RFI a Berlim
A Berlinale 2024 conta neste ano com quatro produções brasileiras, três delas dirigidas por mulheres. Além de Juliana, concorrem Janaina Wagner, com o documentário “Quebrante”, na mostra Forum Expanded, e Caroline Cavalcanti, com “Lapso”, na seção Generation 14plus.
Para Juliana, o espaço dado às mulheres no cinema brasileiro vem melhorando nos últimos anos, “principalmente num contexto de cinema mais alternativo e autoral”. No entanto, segundo ela, esse “ainda é um meio muito dominado por homens brancos, principalmente no acesso a longas-metragens”.
A cineasta percebe um aumento da diversidade na produção de curtas-metragens “de outros gêneros, identidades e outras raças”, mas “é muito desigual ainda”. “É algo que a gente tem que não só conquistar, mas também queremos que se permita que a gente acesse, que tenha recursos, suporte, e abertura para poder produzir essas imagens nesses outros locais”.
Queda na presença de produções brasileiras
Após um recorde de 19 produções concorrendo na Berlinale em 2020, o Brasil vê a presença de cineastas cair neste ano. Para Juliana, esse é um reflexo dos ataques contra o setor cultural nos últimos anos. “A gente passou por um período, desde o golpe contra a Dilma, com Temer e depois o governo Bolsonaro, em que foi tendo primeiro uma diminuição dos recursos públicos e depois um desmonte mesmo, com várias ações para desmantelar a produção cultural”, lembra.
A cineasta espera que a situação melhore no governo Lula. “Foi retomado o Ministério da Cultura, estão sendo retomados os mecanismos de financiamento, e espero que a gente consiga reconstruir o que estava bem estabelecido anteriormente”, diz.
Outra expectativa de Juliana é uma maior preocupação com uma distribuição dos recursos ao cinema pelo Brasil, “para que não fiquem somente em São Paulo ou no Rio de Janeiro e para que pequenas produtoras também consigam realizar longas”, além da diversidade de olhares, “para ter realizadores de diferentes raças e gêneros”.
“Espero que comecem a acontecer mais incentivos para que a gente consiga voltar a ter uma produção maior de cinema. Aí, com certeza vai ter uma presença maior de filmes brasileiros nos festivais”, reitera.
Duas histórias de migração
“Cidade; Campo” teve estreia aplaudida na segunda-feira (19) na Berlinale. O longa conta duas histórias de migração em direções opostas em que são abordadas temáticas como relações de trabalho e com a natureza, empoderamento feminino, amor entre duas mulheres, luto, entre outras.
O filme inicia com a saga de Joana (interpretada por Fernanda Vianna), que teve sua casa destruída na tragédia de Mariana (MG) e busca abrigo na casa da irmã, Tânia (Andrea Marquee), em São Paulo (SP). Na sequência, a trama se concentra em Joana (Mirella Façanha), que se muda com a esposa Mara (Bruna Linzmeyer) do meio urbano para a fazenda do pai, após seu falecimento.
Segundo Juliana, a ideia inicial do filme partiu de uma vontade de falar sobre deslocamentos do local de origem e a adaptação em outros lugares, dando destaque às diferentes vivências entre o meio urbano e o rural. “Eu sempre pensei em construir o filme com duas histórias que não se conectassem, que fossem com personagens distintos, em lugares distintos, mas que eu pudesse mostrar as duas perspectivas: de quem sai do campo para a cidade e de quem vai da cidade para o campo, mas sempre pensando o campo no final como se fosse o regresso à nossa origem”, explica.
Em ambos os segmentos, Juliana traz de volta elementos fantásticos marcantes de sua filmografia, o que faz dela uma das líderes neste gênero entre a nova geração de cineastas no Brasil. Para ela, filmes de horror ainda sofrem muito preconceito no país, o que dificulta o espaço para essas produções.
“’Cidade; Campo’ não chega a ser um filme de horror, mas ele dialoga com a fantasia e o horror. Me interessa muito lidar com esses temas, então me vejo continuando porque acho que tem muita possibilidade simbólica de usar esses gêneros para contar histórias”, ressalta a cineasta.
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