Linha Direta

Lula tenta formar governo de coalizão para garantir governabilidade

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O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva corre para reunir forças políticas além daquelas que o ajudaram a vencer a eleição. Na economia, o desafio é convencer que haverá compromisso com o equilíbrio das contas públicas.

O presidente eleito Lula esta em busca de um governo de coalizão.
O presidente eleito Lula esta em busca de um governo de coalizão. REUTERS - MOHAMED ABD EL GHANY
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Raquel Miura, correspondente da RFI em Brasília

Se a análise de dados e projetos dos vários ministérios ficou a cargo da equipe de transição, sob comando do vice eleito, Geraldo Alckmin, quando se fala em angariar apoio político é o presidente eleito, Lula, que tem saído a campo e comandado as reuniões. Ele sabe que o sucesso de seu governo depende de uma base no Legislativo e isso ele não obteve nas urnas, já que o PT e seus aliados conseguiram eleger menos de 140 de um total de 513 deputados.

Além do MDB, cujas tratativas estão mais avançadas, Lula falou com o partido União Brasil e quer também contar com parte do centrão, tanto que prometeu apoio a um novo mandato de Arthur Lira (PP/AL) na presidência da Câmara, de olho inclusive na votação da PEC da transição, peça-chave para o início da nova gestão.

“O apoio do governo Lula a essa eleição do Lira é quase inevitável nesse contexto. O instrumento do orçamento secreto foi algo que deu muito popularidade a Arthur Lira diante dos outros parlamentares. Seria muito difícil construir uma outra candidatura viável no curto prazo. As eleições já são agora no começo do ano”, disse à RFI a cientista política Graziela Testa, da Escola de Políticas Públicas e Governo da FGV.

Ela avalia que o apoio do PT a Lira é um aceno de que o novo governo busca construir a governabilidade com partidos que não necessariamente apoiaram Lula no período eleitoral.

“Construir o que a gente chama de coalizão em ciência política. É um grupo de partidos que com alguma segurança vota de acordo com a orientação do Executivo. Não é que esse grupo vá fazer tudo o que o presidente quer, mas haverá alguma segurança de que o presidente consegue governar”, explica a analista.

Esse arranjo político pressupõe, de um lado, a oferta de votos no Parlamento e, do outro, a ocupação de cargos e a condução do orçamento de ministérios. Os políticos gostam de dizer que isso significar também dividir responsabilidade na condução das políticas públicas.

“Por mais que Fernando Henrique Cardoso não fosse um grande fã do então PFL, o partido compunha o governo e, portanto, ocupava cargos. Por mais que o presidente Lula não fosse um grande fã do MDB, a sigla compunha o governo e tinha uma pasta ministerial. Essa é uma das formas de construir governabilidade. A outra forma é compartilhar recursos, que foi a principal estratégia do presidente Bolsonaro, sobretudo por meio do orçamento secreto”, acrescenta.

Ainda que prevaleça um governo de coalizão, a analista acredita que a prática de garantir recursos volumosos para redutos eleitorais dos políticos sem rastreamento ou identificação do parlamentar atendido (orçamento secreto) não será tão facilmente extinta.

“Tem muitos eleitos que já estão contando com esse dinheiro para cumprir promessas de campanha. Então, não vai ser tão simples tirar esse processo de uma hora para outra, mas o que eu posso dizer é que há outras possibilidades de construção de governabilidade”, afirmou Testa.

Enquanto busca acordo com o Congresso, o futuro governo sabe que também precisa dialogar com outros setores, incluindo aí as forças produtivas e o mercado financeiro. Diante de apelos da equipe de transição para que os parlamentares aprovem a PEC da transição, tirando despesas sociais do teto de gastos, esse grupo acha que o governo precisa se comprometer de forma clara com o equilíbrio nas contas e que já passou da hora do anúncio do ministro que vai comandar essa área.

Haddad: escolha provável no comando da economia

O economista Gilberto Braga, professor da Fundação Dom Cabral e do Instituto Brasileiro de Mercados de Capitais (Ibmec), disse à RFI que o mercado acredita que o nome será mesmo o do ex-prefeito petista Fernando Haddad.

“Há duas leituras nesse caso pelo mercado. Num primeiro momento, os chamados operadores financeiros, que atuam com gestão de recursos de curto prazo, fundos de investimento, bolsa de valores, tendem a ter uma reação negativa porque ele é alguém de fora do metiê. Já do lado empresarial, das grandes companhias, das empresas, tende a haver uma leitura positiva por causa de um maior traquejo político”, disse Braga.

O analista lembra que embora não seja economista de formação, Haddad tem pós-graduação na área e vai trabalhar com uma equipe de técnicos. “Algo semelhante se deu com Antônio Palocci, no primeiro governo Lula, que é médico de formação, mas foi um ministro da Fazenda exitoso”.

“Haddad não é o nome dos sonhos do mercado financeiro, mas, sendo confirmado na Economia, acredito que será bem aceito com o passar do tempo, embora todo o atual cenário aponte para um quadro de dificuldade nos primeiros seis meses do ano que vem”, prevê Braga.

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