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Mercosul fecha acordo com europeus, e Cúpula marcará 1ª visita de Lula à Argentina desde posse de Milei

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Nesta quarta-feira (2), na reunião prévia à 66ª Cúpula do Mercosul, o bloco sul-americano vai anunciar um tratado comercial com a Associação Europeia de Livre Comércio (EFTA, na sigla em inglês), aumentando a pressão para a ratificação do acordo entre o Mercosul e a União Europeia. Dentro da União Alfandegária do bloco, o Brasil faz uma concessão ao presidente Javier Milei para facilitar um acordo bilateral com Donald Trump. No campo político, esta será a primeira visita do presidente Lula à Argentina desde a posse de Javier Milei, em 2023.

Na cúpula do Mercosul, em Buenos Aires, um acordo comercial deve ser anunciado entre o bloco sul-americano e os países europeus que compõem o EFTA.
Na cúpula do Mercosul, em Buenos Aires, um acordo comercial deve ser anunciado entre o bloco sul-americano e os países europeus que compõem o EFTA. Flickr/ Mercosur
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Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires

Esta edição da Cúpula do Mercosul, como é de praxe, começa na manhã desta quarta-feira com reuniões entre ministros da Economia e entre chanceleres.

No final do dia, o presidente Lula chega a Buenos Aires para participar, na quinta-feira (3), da reunião de Cúpula propriamente dita.

O encontro acontece num cenário de guerra comercial, com a imposição de tarifas por parte da administração norte-americana de Donald Trump, e com conflitos bélicos.

Esse contexto geopolítico tem incidência direta em anúncios e decisões. Será anunciado nas próximas horas um tratado de livre comércio entre o Mercosul e a EFTA, bloco europeu formado por Suíça, Liechtenstein, Islândia e Noruega.

Assim como o tratado entre o Mercosul e a União Europeia, este acordo com a EFTA já tinha sido anunciado em 2019, mas também ficou bloqueado devido ao capítulo ambiental sobre o qual os europeus exigiam garantias.

Nas últimas rodadas de negociação, ainda havia pendências em capítulos como regras de origem e propriedade intelectual. Mais especificamente, a indústria farmacêutica da Suíça queria garantias adicionais de que o Brasil não quebraria patentes para produzir localmente determinados medicamentos.

O Brasil aproveitou a negociação para ampliar o capítulo de compras governamentais que pode dar um impulso ao setor industrial brasileiro.

O contexto internacional de aumento do protecionismo nos Estados Unidos levou os europeus a acelerarem a abertura de novos mercados. Isso impulsionou para agora um entendimento com o Mercosul que poderia ficar para o segundo semestre.

O acordo a ser anunciado oficialmente nesta quarta-feira (2) abre um mercado de US$ 4 trilhões para os produtos do Mercosul. 

Este acordo com a EFTA também funciona como elemento de pressão para a ratificação do acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia, cujas negociações foram concluídas em dezembro passado, apesar da oposição de alguns países europeus.

Exceções à regra para agradar Milei

O Mercosul vai anunciar a ampliação da lista de exceções à Tarifa Externa Comum (TEC). Todos os produtos e componentes importados pelo Mercosul precisam pagar uma tarifa comum. Essa unificação de critérios é o que forma a União Alfandegária.

Quando se criam exceções a essa regra, gera-se uma União Alfandegária imperfeita. A soma de várias exceções pode ser fatal para o futuro de uma integração comercial.

Até hoje, o Mercosul tinha 100 categorias tarifárias como exceções. Agora, essa lista será ampliada a mais 50 categorias, uma ampliação de 50% nas possibilidades de reduzir tarifas.

Isso permite que um membro possa negociar de forma bilateral com países de fora do bloco exceções à regra comum.

Esta é uma concessão do Brasil para a Argentina com o objetivo de desmantelar o discurso do presidente Javier Milei de romper com o bloco para negociar acordos comerciais pelo mundo.

Milei queria um acordo de livre comércio com os Estados Unidos, mas deve-se contentar com algo bem menor: um acordo de preferências para o qual essa nova lista de flexibilizações é fundamental.

Ao mesmo tempo que Milei quer usar essas exceções para negociar com o presidente norte-americano, Donald Trump, uma lista de isenção de alíquotas, o Brasil também pode usar essas 50 novas categorias tarifárias com o mesmo fim comercial.

Açúcar e automóveis

Para que a soma das exceções não descaracterize o bloco, o Brasil quer aproveitar a tendência de o governo Milei aceitar negociações comerciais para incorporar dois setores que nunca fizeram parte do Mercosul: o setor açucareiro e, sobretudo, o automotivo, responsável pela maior parte do comércio bilateral entre Brasil e Argentina.

Em 34 anos de Mercosul, a incorporação de açúcar e de automóveis e autopeças à TEC ficou sempre pendente, devido ao protecionismo dos argentinos que impediu qualquer avanço.

O setor de açúcar ficou sempre de fora e o setor automotivo teve um acordo bilateral entre Brasil e Argentina, limitado a cotas no intercâmbio comercial, mas sem uma política comum.

Esse será um dos desafios do Brasil neste segundo semestre, quando vai exercer a Presidência semestral do Mercosul.

Lula pode visitar Cristina Kirchner na prisão

Não haverá, sob nenhuma hipótese, uma reunião bilateral entre os presidentes Lula e Milei. Os dois continuam sem se falar.

Porém, existe a possibilidade de uma visita do presidente Lula à sua aliada, a ex-presidente Cristina Kirchner, em prisão domiciliar desde o dia 17 de junho, após o Supremo Tribunal argentino confirmar a sentença de seis anos de prisão e inabilitação perpétua a ocupar cargos públicos.

Para uma visita de Lula à Cristina Kirchner é necessária uma autorização judicial, já pedida pela defesa da condenada. Existe ainda a possibilidade de o presidente Lula se aproximar do edifício onde Cristina Kirchner está presa e cumprimentar a ex-presidente pela varanda, à qual ela costuma sair.

No entanto, essa atitude, com um alto impacto político local, pode prejudicar Cristina Kirchner porque o tribunal que concedeu a prisão domiciliar foi claro ao sublinhar que a ex-presidente não deve gerar situações que perturbem a tranquilidade da vizinhança.

Mas onde a visita de Lula geraria irritação é na atual Presidência argentina. Javier Milei é inimigo político de Cristina Kirchner e de Lula.

Mas, como membros do governo brasileiro recordam, em julho do ano passado, Javier Milei abandonou a reunião do Mercosul em Assunção, no Paraguai, para viajar ao Brasil e visitar o ex-presidente Jair Bolsonaro num evento político em Camboriú, Santa Catarina.

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