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No Cairo, ativistas internacionais pressionam o Egito pela abertura total da fronteira com Gaza

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Dezenas de integrantes do grupo Ativistas Internacionais pela Palestina Livre (IAFP, na sigla em inglês) se encontram atualmente no Cairo e devem entregar nesta quinta-feira (30) uma carta ao ministro egípcio das Relações Exteriores, Sameh Shoukry, em que pedem que mais caminhões com suprimentos entrem em segurança na Faixa de Gaza através da fronteira com o Egito.

No Cairo, ativistas internacionais pedem mais acesso à Faixa de Gaza.
No Cairo, ativistas internacionais pedem mais acesso à Faixa de Gaza. © Vinícius Assis
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Por Vinícius Assis, especial para a RFI no Egito

Os ativistas também pedem que médicos, jornalistas, advogados e trabalhadores humanitários do Comboio da Consciência Global sejam autorizados a ir a esta região que vem sendo bombardeada por Israel desde o mês passado. O Egito, assim como o Catar, vem tendo um papel importante nas negociações entre autoridades israelenses e palestinas. Mas as decisões sobre o controle da fronteira não são tomadas apenas pelo governo egípcio.

A australiana Gaye Demanuele, em nome do IAFP, criticou a atual proibição de viagens para a fronteira do Egito com Gaza e as dificuldades para que mais ajuda humanitária cheguem ao destino final.

“Estes governos se recusam a agir de forma eficaz, uma vez que seus interesses econômicos, militares e de proteção das fronteiras estão alinhados com o Estado sionista de Israel. Nossos governos não falam por nós. Estamos aqui para resistir à desumanidade e agir em solidariedade ao povo palestino”, ela afirmou em um comunicado enviado a jornalistas.

Esses ativistas vieram de diversos países. Alguns deles já estão no Cairo desde outubro, como um francês que prefere não ter seu nome divulgado. Filho de mãe muçulmana e pai cristão, ele se diz ateu e se juntou aos voluntários do Crescente Vermelho que encaixotam alimentos e medicamentos a serem enviados para os habitantes da Faixa de Gaza.

“Inacreditável”

Mas ainda há muitos caminhões no lado egípcio da fronteira, carregados com esses itens, à espera de autorização de acesso, o que o francês classifica como algo “inacreditável”. “Isso me faz pensar que governos que colocam dificuldades para que essa ajuda chegue até Gaza querem a morte dos palestinos”, denunciou.

O ativista também participou de um ato em frente à sede do Sindicato dos Jornalistas, no Cairo, que reuniu manifestantes egípcios e estrangeiros. Na escadaria do imponente edifício localizado no centro da capital do país, muitos usavam roupas pretas e também tinham sobre os ombros um “kufiya”, o tradicional lenço palestino branco com estampas pretas.

Por quase uma hora, eles gritaram palavras de ordem contra o massacre de palestinos, em árabe e em inglês. Os manifestantes compararam o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, ao alemão Adolf Hitler. Biden é o principal aliado de Netanyahu neste conflito que já matou milhares de pessoas desde o dia 7 de outubro. Estima-se que quase metade das vítimas eram crianças.

A ativista palestina Mariam Abu Daqqa (centro) criticou governos que apoiam Israel.
A ativista palestina Mariam Abu Daqqa (centro) criticou governos que apoiam Israel. © Vinícius Assis

Depois da manifestação, jornalistas se reuniram no terceiro andar do prédio para uma coletiva. A veterana ativista pelos direitos dos palestinos Mariam Abu Daqqa fez um breve pronunciamento. Semanas atrás ela foi deportada da França, onde estava para participar de uma série de palestras pelo país.

O governo francês alegou que Daqqa foi deportada porque faz parte do partido de esquerda Frente Popular para a Libertação da Palestina, “uma organização que consta na lista da União Europeia como sujeita a medidas restritivas na luta contra o terrorismo”.

A ativista de 72 anos criticou os governos que apoiam Israel. “Essa é a nossa causa, este é o nosso povo. Estamos juntos. Precisamos do Estado da Palestina”, reforçou em seu discurso.

“Governo francês não apoia os direitos humanos”

O ativista francês entrevistado pela reportagem da RFI criticou ainda a deportação da palestina Mariam Abu Daqqa. “Isso mostra a verdadeira face do governo francês, que na verdade não apoia os direitos humanos”, declarou. Ele também afirmou que pretende continuar no Egito, porque se sente mais seguro neste país do que na França, onde acredita que possa acabar “preso por apoiar a paz”.

A manifestação desta quinta-feira no Cairo foi organizada devido ao Dia Internacional em Solidariedade aos Palestinos, classificado pelo secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, como um momento para reafirmar o direito do povo palestino de viver em paz e com dignidade.

“Já passou da hora de avançar de forma determinada e irreversível em direção a uma solução de dois Estados, com base em resoluções da ONU e no direito internacional”, ele postou em uma rede social.

À frente do Serviço de Informação do Estado (SIS) do Egito, Diaa Rashwan disse que mais de 25 mil toneladas de produtos para ajuda humanitária já foram levadas à Faixa de Gaza, incluindo água, alimentos e suprimentos médicos, além de tendas e lonas. De acordo com os termos do acordo de trégua entre Israel e o Hamas, 200 caminhões de ajuda humanitária, além de 130 mil litros de combustível, podem entrar na Faixa de Gaza todos os dias.

“Não é seguro ser criança em Gaza”

Como uma das reivindicações do grupo de ativistas internacionais também é a assistência aos feridos em Gaza, Rashwan lembrou que o Egito recebeu 566 palestinos feridos para tratamento em seus hospitais desde o início do conflito.

Nas últimas semanas, cerca de 30 bebês prematuros também foram enviados para o Egito. Mais da metade deles está hospitalizada no Cairo. Na opinião de Jeremy Hopkins, representante do Unicef no Egito, um grande desafio será encontrar os pais desses bebês. “Foi uma operação complexa que, dadas as circunstâncias, foi notável. Envolveu outras organizações. Os bebês estão muito vulneráveis. Há toxinas nos corpos deles vindas de água suja, por exemplo. Alguns estão desnutridos”, ele detalhou.

Hopkins ainda acrescentou que a recente trégua nos ataques não é suficiente. “Temos cerca de 30 funcionários trabalhando para o Unicef em Gaza, que estão trabalhando em condições terríveis. Trabalhando dia e noite para garantir que possamos ajudar as crianças. E todas as crianças em Gaza precisam estar seguras. Até que haja uma suspensão completa das hostilidades, não podemos dizer que é seguro ser criança em Gaza”, concluiu.

O responsável pelo Unicef no Egito, Jeremy Hopkins.
O responsável pelo Unicef no Egito, Jeremy Hopkins. © Vinícius Assis

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