Multilateralismo e clima em xeque: pré-COP prepara terreno para decisões cruciais na COP30
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A menos de um mês da maior convenção climática do mundo, mais de 500 representantes de 72 países estarão em Brasília para o evento que ficou conhecido como a pré-COP, a partir de segunda-feira (13). Esta é a última oportunidade antes da COP30, que acontecerá em Belém, para as nações alinharem suas posições políticas e técnicas sobre os maiores desafios da agenda climática global, como financiamento climático e transição energética.

Vivian Oswald, correspondente da RFI em Brasília
O encontro acontece em um contexto geopolítico difícil, enquanto a ONU prepara o relatório-síntese com a projeção da temperatura global para os próximos anos, com base nos esforços prometidos pelos países para conter suas emissões de CO2 em suas NDCs (Contribuições Nacionalmente Determinadas). A expectativa é de números nada tranquilizadores. O problema é que, até agora, apenas 62 NDCs foram apresentadas formalmente. Espera-se que 125 dos 198 países ainda o façam até o final do ano, incluindo grandes emissores como a União Europeia (UE) e a Índia.
Outra grande questão é como e se o mundo conseguirá se livrar dos combustíveis fósseis, responsáveis por 75% das emissões. A COP30 é uma prioridade para o governo Lula e tem como pano de fundo a defesa do multilateralismo, tema central no imbróglio geopolítico internacional, que tem nos EUA seu principal antagonista. Seu sucesso depende da logística de Belém, é claro, mas também da substância propriamente dita.
Embora não se esperem acordos para a pré-COP, ela é uma etapa intermediária do processo de negociação dos diversos temas discutidos no âmbito da COP30. Há 140 decisões a serem tomadas nas chamadas "negociações mandatadas", que são previstas para serem apreciadas em Belém em relação às três estruturas básicas do regime climático.
Para o secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores, Mauricio Lyrio, "o elemento crucial da negociação mandatada é o fato de que isso representa a sobrevivência e a força do regime climático em um momento geopolítico difícil, que inclui a saída dos EUA, um ator importante do Acordo de Paris, o que acontecerá em janeiro de 2026."
Além da negociação, outro tema importante a ser tratado nesta pré-COP, segundo Lyrio, é que a apresentação das NDCs não tem sido tão satisfatória quanto se desejaria, o que pode resultar em uma previsão nada tranquilizadora para a temperatura global nos próximos anos, em sua avaliação.
EUA não enviam representantes
Tudo isso com os EUA, um dos maiores emissores do mundo, prestes a deixar o Acordo de Paris. Os EUA não enviaram representantes para a pré-COP. Na verdade, o país não participou de nada este ano. A expectativa é de que tampouco compareça à COP30 em Belém. Eles já haviam enviado sua NDC durante o governo do democrata Joe Biden. A questão é que, assim que tomou posse, o presidente Donald Trump anunciou que o país se retiraria novamente do Acordo de Paris, o que, pelos prazos legais, será efetivado em janeiro do próximo ano. Trata-se de uma perda importante. Contudo, a presidência da COP30 afirma que essa saída não significa o fim da participação dos EUA no processo. Isso porque estados, municípios e empresas dos EUA seguem engajados em compromissos climáticos.
A ministra Marina Silva afirmou que é preciso estreitar os laços entre os países e reforçar o multilateralismo para que a COP30 seja a "COP da verdade", como já afirmou o presidente Lula. Ela disse que este é o momento em que os países poderão evitar os chamados pontos de não retorno em relação ao sistema multilateral, que está sendo enfraquecido. Marina destaca que é necessário restabelecer a confiança, a cooperação e a solidariedade, além de retomar o caminho para cumprir a decisão tomada na COP28, em Dubai, de triplicar a energia renovável, duplicar a eficiência energética e afastar a transição dos combustíveis fósseis e do desmatamento. É o momento da ação, como tem reforçado o governo brasileiro, que aposta em iniciativas concretas.
A principal delas é o TFFF, um fundo que está sendo criado com recursos públicos, alavancados por dinheiro privado, para alcançar US$ 125 bilhões e financiar a manutenção das florestas. Será um investimento de mercado, que trará rendimentos aos seus investidores, mas que aplicará em projetos voltados para a proteção das florestas nos países em desenvolvimento, sendo o Brasil um dos beneficiados.
Financiamento
O financiamento é um dos maiores desafios da COP30. A COP anterior, no Azerbaijão, não conseguiu chegar a um acordo sobre quem arcaria com essa conta. Agora, as presidências da COP30 e da COP29 (do Azerbaijão) estão preparando o chamado "mapa do caminho" para entender como alcançar o valor de US$ 1,3 trilhão.
Embora não se espere o anúncio sobre isso na pré-COP, esse tema está presente e continua a ser discutido entre todos. Segundo o presidente da COP30, embaixador André Corrêa do Lago, o relatório contará também com a contribuição dos ministérios da Fazenda. Ele lembra que tudo isso é tema da pré-COP, que servirá para discutir e entender os limites e as flexibilidades de alguns dos principais grupos negociadores.
Existe uma frustração por parte dos países em desenvolvimento, que esperam que as nações ricas cumpram seu compromisso de contribuir com US$ 300 bilhões por ano a partir de 2035 para o financiamento do combate à mudança do clima. O problema é que elas já não cumpriram a meta anterior, que era de US$ 100 bilhões por ano.
A presidência da COP30 conduzirá sessões plenárias, reuniões temáticas e consultas informais. Além disso, apresentará o progresso de iniciativas como a Agenda de Ação, o Roteiro de Baku a Belém (liderado pela Presidência da COP29), além dos chamados Círculos de Liderança da COP30, como o dos Ministros das Finanças e o do Balanço Ético Global. O evento contará com a abertura do presidente em exercício, Geraldo Alckmin.
O presidente Lula, que está em Roma nesta segunda-feira, participando de um evento sobre segurança alimentar, deve comparecer ao encerramento da pré-COP na terça-feira. Também devem estar presentes na abertura os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, das Relações Exteriores, Mauro Vieira, e do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva.
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