STF condena Bolsonaro a mais de 27 anos de prisão e rompe com tradição de impunidade
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As penas dos oito condenados pelo Supremo Tribunal Federal nesta quinta-feira (11), por tentativa de golpe de Estado, somam 159 anos, 4 meses e 15 dias de prisão. Jair Bolsonaro recebeu a pena mais alta: 27 anos e 3 meses de reclusão. Já Mauro Cid, peça-chave no processo por ter firmado acordo de delação premiada, foi condenado a dois anos em regime aberto, com restituição de bens e isenção de multa.

Raquel Miura, correspondente da RFI em Brasília
O resultado histórico, que rompe com a tradição de impunidade para aqueles que atentam contra a ordem institucional, ganha agora um novo capítulo com o início das discussões políticas sobre o caso no Congresso Nacional.
Jair Bolsonaro, que sempre elogiou o golpe de 1964, foi condenado a um regime inicialmente fechado, que deve ser cumprido até ser esgotada a fase de recursos no Supremo Tribunal Federal. Alguns apostam que o desfecho jurídico se dará ainda este ano.
Aliados do ex-presidente vieram a público para dizer que consideraram abusivo o tamanho da punição e insistem que golpe não concretizado não é golpe, a exemplo do que agora prega o ministro Luiz Fux.
Para o jurista e professor de direito penal da FGV/RJ, Tiago Bottino, o resultado já era esperado. “Eu entendo que a pena de Bolsonaro está dentro de uma margem que já era esperada. Alguns analistas imaginavam que ele poderia receber penas ainda mais altas, próximas das máximas de cada crime, mas o relator foi comedido na aplicação e levou em consideração as causas de aumento e de diminuição previstas no Código Penal”, afirmou.
“A pena maior de Bolsonaro em relação aos demais condenados é consequência da posição de liderança nos crimes praticados”, disse Bottino.
Além de Bolsonaro, as penas do STF para o núcleo central da trama golpista foram 26 anos para Walter Braga Netto, 24 anos para Almir Garnier, 24 anos para Anderson Torres, 21 anos para Augusto Heleno, 19 anos para Paulo Sérgio Nogueira e 16 anos, 1 mês e 15 dias para Alexandre Ramagem. Mauro Cid foi condenado a 2 anos em regime aberto.
Esperança política
Bolsonaro quer usar o ativo político que ainda tem para conseguir reverter a situação, aplicando uma equação direta: vai apoiar quem o ajudar. E ele tem peso político importante para a direita, ainda mais numa disputa com Lula.
“Em 2026 o grupo da direita, para ter chances e ser competitivo, precisa do apoio de Bolsonaro”, avalia o cientista político André Rosa. Ele, porém, não vê mudança significativa no eleitorado após o resultado do julgamento.
“O que dá para perceber, tendo um recorte mais temporal, é que talvez nem a esquerda, nem a direita ganhe, porque essa polarização, essa divisão ideológica é muito proporcional, a gente tem uma média de 50% pra cada lado. Eu acredito que a condenação reforça mais a torcida de ambos os lados”, disse Rosa, que citou o exemplo de Lula em 2022:
“Se nós pegarmos na história recente, Lula foi condenado e logo depois virou presidente da República. Então não acredito que, quanto aos eleitores, o resultado do STF tenha tanta influência”, afirmou.
Interesses eleitorais
Outro analista ouvido pela RFI, o cientista e consultor Leonardo Barreto, destaca que o voto do ministro Fux pela absolvição de Bolsonaro e a relação tensa do Congresso com o STF, por exemplo, no caso das emendas parlamentares, ajudam o ex-presidente, ainda que o desfecho dependa também de interesses eleitorais.
“Hoje haveria maioria tanto na Câmara quanto no Senado pela anistia. Agora existe uma discussão sobre o tamanho dessa anistia por uma razão. O centrão quer os votos do Bolsonaro em 2026, mas não quer a liderança de Bolsonaro. Por outro lado, a família do ex-presidente quer discutir essa questão de 2026, mas só com o ex-presidente gozando de todos os seus direitos políticos. Ele quer fazer isso depois e aí não há um compromisso político possível”, analisa Barreto.
O cientista político, no entanto, cita duas circunstâncias recentes que podem elevar a pressão por uma alteração das penas no Congresso. “O engajamento do governador paulista Tarcísio de Freitas, que percebeu que se ele não se posicionasse de forma mais contundente, poderia dar adeus aos votos bolsonaristas em 2026. Antes Tarcísio falava em indulto, agora fala em anistia. E o segundo ponto é o voto de Fux. Não é que ele tenha criado um colapso, mas deu força para interpretações diferentes daquela que prevaleceu no STF”.
Barreto diz que é difícil prever.
“Não sei se a anistia vai ser aprovada, mas acho que tem chances”.
E isso pode levar a um novo embate com a Suprema Corte, uma vez que ministros já sinalizaram que não há respaldo constitucional para uma proposta como essa.
Daí o coro dos que buscam um meio-termo, com redução das penas. Resta ver se Bolsonaro se daria por satisfeito e se tem mesmo cacife para pedir mais.
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