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Dois anos após o ataque do Hamas, Israel vive entre o trauma e a expectativa pelo fim da guerra

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O 7 de Outubro é uma data marcante na história de Israel e do Oriente Médio. Nesse dia, em 2023, o Hamas atacou a região sul de Israel, rompendo a fronteira da Faixa de Gaza e iniciando uma ofensiva sem precedentes contra cidades e kibutzim — pequenas comunidades agrícolas. Em apenas um dia, 1.200 pessoas foram mortas. Em resposta, Israel iniciou uma guerra que ainda está em curso e que, segundo o Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo Hamas, já causou a morte de mais de cerca de 67 mil palestinos.

Um morador do kibutz de Kfar Aza coloca uma vela em homenagem a Ofir Shoshani, uma das vítimas do ataque do Hamas, durante uma cerimônia realizada nesta terça-feira, 7 de outubro de 2025.
Um morador do kibutz de Kfar Aza coloca uma vela em homenagem a Ofir Shoshani, uma das vítimas do ataque do Hamas, durante uma cerimônia realizada nesta terça-feira, 7 de outubro de 2025. REUTERS - Ronen Zvulun
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Henry Galsky, correspondente da RFI em Israel

O dia de hoje é marcado por muita emoção em Israel. Nesta terça-feira (7), diversas cerimônias estão programadas em memória das vítimas do 7 de Outubro, que representa o maior número de judeus mortos em um único dia desde o Holocausto. Os canais de televisão exibem programação especial, com documentários, entrevistas e espaço para os sobreviventes e familiares dos 48 reféns israelenses ainda mantidos em cativeiro pelo Hamas na Faixa de Gaza.

Neste ano, a data coincide com o feriado de Sucót, a Festa dos Tabernáculos. Durante essa semana, os judeus constroem cabanas ao ar livre,  chmadas de "sucot", que simbolizam a fragilidade do povo de Israel durante os 40 anos de travessia pelo deserto após a saída do Egito, por volta de 1300 a.C.

Em Re'im, local do festival de música Tribe of Nova, onde 380 pessoas foram assassinadas pelo Hamas, será erguida uma dessas cabanas. Ali, os familiares das vítimas compartilharão as histórias de seus entes queridos.

À noite, a cerimônia central ocorrerá no Parque HaYarkon, em Tel Aviv, reunindo os familiares dos reféns e cerca de 25 mil pessoas que esgotaram os ingressos disponíveis. Grandes nomes da música israelense se apresentarão em um palco que não será de celebração, mas de lembrança e esperança pela libertação dos reféns e pelo fim da guerra.

Sobreviventes e reconstrução

A RFI conversou com Pérola Gaz, brasileira de 70 anos que vive em Israel desde 1987 e morava no kibutz Be'eri. No dia 7 de Outubro de 2023, ela acordou com o som das sirenes, acionadas devido aos ataques com foguetes do Hamas. Na noite anterior, duas de suas netas haviam dormido em sua casa, algo comum na rotina da família, já que seus dois filhos e sete netos também residem em Be'eri.

Com as sirenes soando, Pérola levou as meninas — então com seis e dez anos — para o quarto protegido, um cômodo com paredes de concreto e porta de ferro. Ela acreditava que a situação se normalizaria em breve, como já ocorrera em outras ocasiões. Mas desta vez, não foi assim.

Terroristas do Hamas invadiram o kibutz, inclusive a casa de Pérola. Ela manteve as netas em silêncio no quarto de abrigo por 20 horas, até serem resgatadas por soldados do Exército de Israel.

O kibutz, uma comunidade coletiva com inspiração socialista, foi praticamente destruído em poucas horas. Quase todos os vizinhos de Pérola foram mortos. Dez por cento dos pouco mais de mil moradores foram assassinados, casas foram incendiadas, mulheres estupradas e 30 pessoas sequestradas.

Dois anos depois, a brasileira e sua família vivem em outro kibutz, mais ao sul do país, enquanto aguardam a reconstrução de Be'eri. Ela, o marido, os filhos e os netos decidiram retornar assim que as obras forem concluídas, o que deve ocorrer em meados de 2026.

“É muito difícil superar traumas como esse. Há dias piores, há dias melhores. Penso em voltar porque faço parte dessa comunidade”, conta Pérola Gaz.

Be'eri, localizado a apenas 4,5 km da Faixa de Gaza, foi um dos kibutzim invadidos pelo Hamas nos ataques que deram início ao atual ciclo de violência.

Mais ao sul está Nir Oz, onde viviam 400 pessoas. A apenas 2,5 km de Gaza, o kibutz foi quase totalmente destruído. Nessa pequena comunidade, 117 pessoas foram sequestradas ou assassinadas. Dos 48 reféns ainda mantidos em cativeiro, 20 dos quais ainda vivos, nove são de Nir Oz.

“Só daqui a três anos vamos reconstruir completamente Nir Oz. Algumas famílias já retornaram. Alguns jovens também estão no kibutz para ajudar a reerguer a comunidade. Somos refugiados internos em Israel e será preciso construir um novo kibutz, maior do que o anterior”, diz à RFI Rita Lifshitz, de 84 anos.

“85% do kibutz precisam ser reconstruídos do zero, pois as casas foram queimadas e destruídas na invasão do Hamas”, destaca Rita Lifshitz.

O processo de reconstrução dos kibutzim está em fase avançada. Amit Salvi, responsável pela área econômica de Be'eri, afirma à RFI que entre 90% e 95% dos moradores devem retornar. Em termos de segurança, ele diz ter recebido garantias de que o Exército de Israel manterá presença constante entre Gaza e a área do kibutz.

Segundo relatório do governo israelense, dos 17,5 bilhões de shekels (cerca de R$ 28 bilhões) destinados à reabilitação das comunidades atacadas ao longo de cinco anos, cerca de 7,9 bilhões de shekels (R$ 13 bilhões) já foram investidos. Outros 525 milhões de shekels (R$ 850 milhões) foram reservados para projetos que incentivem o retorno dos moradores.

Negociações em curso para o fim da guerra

Há grande expectativa com o início das negociações no Egito pelo fim da guerra na Faixa de Gaza. Fontes citadas pela imprensa israelense afirmam que, em poucos dias, ficará claro se o Hamas está realmente comprometido com o plano de Trump.

Após o Hamas demonstrar disposição para libertar todos os reféns israelenses na primeira fase do plano, o próprio primeiro-ministro Benjamin Netanyahu declarou esperar anunciar o retorno dos reféns ainda durante o feriado de Sucót, que vai até o dia 13.

Internamente, Israel já se mobiliza. Gal Hirsch, responsável do governo para assuntos de reféns, reuniu-se com Julien Lerisson, chefe da delegação da Cruz Vermelha em Israel.

Nas libertações anteriores, a Cruz Vermelha foi responsável por transferir os reféns das mãos do Hamas para o Exército de Israel.

O Ministério da Saúde também acionou três dos principais hospitais da região central do país para que iniciem os preparativos para receber e tratar os reféns.

Nos Estados Unidos, o secretário de Estado Marco Rubio afirmou que 90% dos detalhes de um possível acordo entre Hamas e Israel já foram definidos.

O enviado especial do governo dos EUA, Steve Witkoff, e Jared Kushner, genro de Trump, devem chegar nesta terça-feira ao Egito.

O mesmo é esperado de Ron Dermer, ministro de Assuntos Estratégicos de Israel e um dos principais aliados políticos de Netanyahu.

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