Atriz e dramaturga brasileira encerra turnê europeia na França com solo sobre colonização e natureza
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A atriz e performer brasileira Izabel de Barros Stuart está em Paris encerrando a turnê europeia de seu monólogo Le Sol(o) de la Canne à Sucre (O Solo da Cana), espetáculo que estreou no Brasil em 2023 e vem trilhando uma trajetória de sucesso. A peça passou por Portugal — em Porto e Lisboa — antes de chegar à capital francesa. O texto, escrito pela própria artista, parte de uma perspectiva inusitada: a cana-de-açúcar assume a palavra e narra, em primeira pessoa, sua experiência com a colonização.
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Izabel explica que a ideia surgiu de sua reflexão sobre a temática colonial, já profundamente entrelaçada ao seu engajamento com o ativismo ambiental. “Fiquei procurando de onde vinha a voz que eu poderia expressar esses assuntos. Qual seria o lugar de fala dessa voz?”, conta. Foi então que se deparou com a paisagem de um grande latifúndio privado de monocultura de commodities, o que a levou a escolher a cana-de-açúcar como protagonista.
A escolha não foi aleatória. Segundo Izabel, a cana é uma commodity extremamente versátil e consumida globalmente. “Todos nós temos um pouco dessa cana já dentro de nós. Nesse sentido, achei que era um bom lugar para poder tocar as pessoas, já que de alguma forma todos nós já estamos contagiados”, afirma.
Para ela, o campo de monocultura é também um campo de colonização. “Essa paisagem da monocultura é um reflexo, um espelho de um pensamento. É esse pensamento que produz uma monocultura, e essa cultura estreita produz um tipo de paisagem que a gente percebe nesse tipo de cultivo — de uma só espécie, em larga escala, de forma repetitiva. Uma paisagem altamente narcísica. Mono.”
Com formação em dança, Izabel estudou na Universidade Paris 8, na região parisiense. A transição para a dramaturgia foi, segundo ela, uma verdadeira aventura. “Eu já escrevia, mas nunca tinha me atrevido a levar um texto meu a público. Mas quando comecei essa escrita, pensando sobre esses assuntos, senti que era um texto de voz alta”, revela.
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Na terra dos colonizadores
Engajada há anos com as questões ambientais e os desafios globais, especialmente a crise climática, Izabel sentiu uma urgência em dar voz a esses temas. “Foi de fato uma aventura experimentar isso, que é uma coisa que eu ainda não tinha feito. Escrever uma coisa... Depois que a gente traz o texto passando pelo corpo, traz ele à boca, já é uma outra dimensão. E de experiência mesmo. Foi fruto de uma urgência, de um atrevimento a partir de questões que para mim já estavam me movendo muito.”
A artista destaca ainda que o corpo carrega uma escritura própria. “Meu corpo já vinha com um repertório que, em contato com essas temáticas e com a própria paisagem — porque eu fiz uma imersão nesses territórios de latifúndio de monocultura —, isso chega no corpo. Essa pobreza de diversidade, essa monotonia, e essa violência com a terra e com as gentes que trabalham na terra, chega no corpo.”
Ao ser questionada sobre como tem sido falar de colonização na terra dos colonizadores, Izabel admite que "tinha um certo receio de qual seria a receptividade, como isso ressoaria na terra dos colonizadores. Ao mesmo tempo, é muito instigante esse movimento: a cana vindo de volta aqui na terra dos colonizadores.”
No entanto, ela relata que, pelo menos em Portugal — no Porto e em Lisboa —, encontrou um interesse e uma atenção muito grandes ao tema. “Tivemos retornos muito positivos. Isso me deixou bastante contente e animada para ver como será aqui em Paris. Mas percebi realmente um interesse, uma vontade de escutar essa versão da cana-de-açúcar sobre a colonização. Esse outro lado.”
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