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Peso econômico do Brasil pode levar Trump a buscar solução pragmática para tarifas, diz pesquisador

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O chanceler Mauro Vieira se reúne nesta quinta-feira (16), em Washington, com o secretário de Estado dos Estados Unidos, Marco Rubio. O encontro é visto pelo Itamaraty como uma oportunidade para insistir na retirada das tarifas de 50% impostas aos produtos brasileiros e das sanções aplicadas a autoridades do país.

Imagem de arquivo mostra o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, durante encontro do G20, na sede da ONU, em Nova York, em 25 de setembro de 2025.
Imagem de arquivo mostra o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, durante encontro do G20, na sede da ONU, em Nova York, em 25 de setembro de 2025. AP - Angelina Katsanis
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Luciana Rosa, correspondente da RFI em Nova York

A reunião ocorre em meio a uma escalada de pressão política de Washington sobre governos da América Latina, como explica o professor Enrique Arias, diretor do Bildner Center for Western Hemisphere Studies e professor de Ciência Política da City University of New York (CUNY).

Segundo Arias, o peso econômico do Brasil pode levar o governo Trump a adotar uma postura mais pragmática nas negociações. Ele lembra que o país ocupa um papel central no comércio global, especialmente em um momento de inflação alta nos Estados Unidos e de tensão comercial com a China. “O governo Trump pode perceber que é mais vantajoso buscar um entendimento com o Brasil do que manter a escalada tarifária”, avalia.

O pesquisador também observa que o recente distanciamento entre o presidente e o bilionário Elon Musk pode abrir espaço para uma relação menos tensionada com Brasília. Segundo ele, a crise entre o empresário e o Supremo Tribunal Federal brasileiro — sobre o conteúdo publicado na rede X — havia alimentado um clima de desconfiança em Washington. Com o afastamento de Musk, afirma Arias, “essa perspectiva pode ter mudado um pouco e aberto espaço para o diálogo”.

Impacto interno das tarifas

Outro fator, segundo o professor, é o impacto econômico interno das tarifas. O aumento dos preços do café e da carne, somado à dificuldade dos Estados Unidos em escoar sua soja devido à disputa com a China, pressiona a Casa Branca. “Os efeitos das tarifas sobre os preços dos alimentos e a preocupação com as exportações de soja podem levar o governo Trump a ver a relação com o Brasil e com o governo Lula como mais importante do que se pensava semanas atrás”, diz Arias.

Enquanto o Brasil tenta restabelecer o diálogo, outros países da região enfrentam maior pressão de Washington. Nesta semana, Trump se reuniu com o presidente argentino, Javier Milei, e ameaçou suspender empréstimos e ajuda financeira caso ele não seja reeleito.

Para Arias, o padrão de comportamento é o mesmo. O governo Trump, segundo ele, busca apoiar líderes ideologicamente alinhados, o que o diferencia de administrações anteriores. “É uma linha mais seletiva e ideológica nas alianças regionais”, resume.

A ofensiva, no entanto, não se limita à economia. Na terça-feira (14), os Estados Unidos realizaram o quinto ataque militar a um barco venezuelano supostamente ligado ao tráfico de drogas, matando seis pessoas a bordo. Desde setembro, já são cinco ações desse tipo, com 27 mortos na costa da Venezuela. Trump afirmou que as embarcações estavam ligadas a redes de “narcoterrorismo” e confirmou ter autorizado a CIA a atuar diretamente na região.

Tradição de intervenções

Segundo Arias, a medida reforça uma tradição de intervenções mais frequentes na área do Caribe e da América Central. Ele lembra que os Estados Unidos “têm uma longa história de ações militares na região e de antipatia com governos bolivarianos, como o da Venezuela”.

Para o pesquisador, o contraste com governos democratas é claro. “As administrações de Obama e Biden foram menos confrontacionais”, observa, “enquanto os republicanos costumam adotar uma abordagem mais agressiva diante de regimes considerados hostis”.

O desafio do Brasil em Washington é encontrar espaço para aliviar as tarifas impostas por Trump sem abrir mão da própria soberania política. O Itamaraty aposta em um diálogo pragmático, mas sabe que, do lado americano, a pauta deve incluir temas sensíveis como Venezuela, Cuba e o papel do Brasil na região.

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