Precisamos 'sair do vício do petróleo’, diz presidente do Ibama na COP30
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País-sede da 30ª Conferência do Clima das Nações Unidas (COP30), o Brasil adotou transparência quanto aos seus planos de abrir novas frentes de exploração de petróleo: já no primeiro dia da Cúpula dos Líderes, o país assumiu suas contradições, ao mesmo tempo em que pautou o debate sobre o afastamento global dos combustíveis fósseis no evento em Belém.

Lúcia Müzell, enviada especial da RFI a Belém
O tempo dirá se a estratégia vai dar certo e, se no final de duas semanas de negociações, os 195 países conseguirão avançar no tema mais crucial para o combate ao aquecimento global. O anúncio da liberação dos testes da Petrobras na margem equatorial, a 170 quilômetros da costa amazônica, ocorreu apenas três semanas antes do início da COP.
"Está todo mundo na contradição. Está todo mundo aqui pedindo um mundo diferente, pedindo hidrogênio, pedindo energia limpa, mas é um mundo que ainda queima carvão, petróleo e uma série de coisas fósseis”, afirma Rodrigo Agostinho, presidente do Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis), que esteve sob forte pressão do governo Lula para acelerar o autorização. "A gente precisa sair desse vício do petróleo”, apontou.
Com o acordo assinado, Agostinho defende um procedimento "rigoroso", após 11 anos de análises, testes e ações complementares, como a instalação de uma nova base de operações de emergência no Oiapoque, além da existente em Belém. "Todas as modelagens apontam que, em mais de 90% dos momentos, se tiver um vazamento de óleo, esse óleo vai para mar aberto em vez de vir para a nossa costa. Mas sempre existe risco”, reconhece.
Riscos seriam menores do que na região do pré-sal
O presidente do Ibama salienta que estes riscos são menores na foz do Amazonas do que em outras frentes de exploração petrolífera no país, como o pré-sal no Rio de Janeiro, São Paulo e Espírito Santo. "São muito mais vulneráveis a um acidente do que bloco 059”, disse, referindo ao ponto que recebeu a autorização para os testes, na margem equatorial.
No total, são mais de 200 blocos mapeados, onde a Petrobras pensa haver reservas de petróleo em águas profundas. O 059 fica no Amapá, a 500 quilômetros da foz do rio Amazonas.
"O pré-sal é muito mais próximo, e em acidentes naquela região, o óleo tende a vir para o litoral, por conta da corrente do Brasil. É diferente daqui da margem equatorial, que é a maior parte do tempo, as modelagens apontam que a maior probabilidade é que esse óleo vá para o alto-mar”, argumenta.
Ex-deputado federal pelo PSB (Partido Socialista Brasileiro), Agostinho fez carreira como ambientalista e assumiu a presidência do Ibama no início do governo Lula. Ele destaca que o órgão federal dispõe de tecnologia avançada para monitorar o óleo em toda a costa brasileira: uma parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) permite detectar manchas "em quase tempo real", com imagens de satélite.
"Agora, durante a perfuração de pesquisa da Petrobras, a gente está exigindo novos simulados para a gente ir testando isso à exaustão”, complementa.
Transição energética lenta
Ao ser questionado sobre as incoerências do governo Lula nesta questão, salienta que a transição energética precisa ser acelerada no país e não está acontecendo na velocidade que deveria. "A gente tem hoje, no Brasil, 124 milhões de veículos, dos quais 70% são flex, mas só 30% estão usando álcool. Então, o problema também está com o consumidor”, apontou. "O consumidor, que podia estar usando um combustível limpo, não está.”
A COP30 em Belém traz estes temas para o debate nacional e poderá impulsionar avanços na conscientização ambiental dentro do país, constata. Mas Agostinho pondera que a grande frente de batalha do Brasil na transição ecológica é o combate ao desmatamento.
A devastação das florestas é responsável por 42% das emissões brasileiras de gases de efeito estufa em 2024, após uma queda recorde de 10% em relação ao ano anterior. “Mesmo que a gente mude a matriz energética, se a gente não manter floresta em pé, a gente vai perder tudo”, resume.
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