Como surge o câncer? Dados moleculares revelam mutações precoces que podem prevenir e tratar a doença
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A cientista francesa Elsa Bernard é chefe da equipe de oncologia computacional do instituto francês Gustave Roussy, um dos maiores centros de combate ao câncer no mundo, situado em Villejuif, nos arredores de Paris. Ela é uma das autoras de um estudo recente, publicado na revista científica Cell, que busca entender os mecanismos individuais e ambientais que estão na origem do aparecimento de diferentes tipos de cânceres.
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Taíssa Stivanin, da RFI
Desde o início de sua carreira, a pesquisadora francesa focou seus estudos na análise de dados moleculares, uma das áreas da Biologia Matemática aplicada à Cancerologia. Após uma temporada nos Estados Unidos e no Reino Unido, onde concluiu seu pós-doutorado, ela voltou para Paris e desde setembro de 2023 integra a equipe do instituto francês Gustave Roussy. O trabalho realizado pela cientista permite acompanhar em detalhes as mutações celulares individuais antes mesmo do aparecimento da doença.
“O câncer atinge todo mundo e os estudos em Oncologia estão em plena transformação. Os dados, principalmente moleculares, são cada vez mais importantes para entender e tratar clinicamente a doença. Eles são gerados cada vez mais e de forma sistemática", explicou a cientista à RFI. "Estamos na era da Medicina de precisão. Podemos utilizar esses dados e explorá-los o máximo possível para prever e entender a evolução da doença em certos casos”, acrescenta.
O estudo publicado na revista científica Cell reúne o trabalho de pesquisadores de diversos países, que identificaram fatores biológicos que podem influenciar no desenvolvimento de um tumor. Essa lista é chamada pelos cientistas de clouds de complexité (nuvens de complexidade, em tradução livre), que são os diferentes parâmetros de interação entre um paciente e seu câncer.
Entre eles, está análise do papel das células que sofreram mutações antes e depois de se transformarem em tumores, além das razões individuais e ambientais que levam ao surgimento do câncer. Elsa Bernard lembra que nem todas as células que mutam serão cancerígenas e entender por que isso acontece é primordial para prevenir e tratar a doença.
“Já sabemos há cerca de 50 anos quais são os gatilhos de transformação de uma célula em cancerígena. Isso ocorre, geralmente, a partir de uma instabilidade no genoma e da sua capacidade de escape imunológico. Esse conjunto de processos é indispensável para essa transformação. Mas ainda sabemos pouco sobre a relação entre o indivíduo e seu tumor”, observa.
A evolução da doença ainda depende de outros fatores mais complexos. Entre eles, a interação com células em torno do tumor e outros órgãos, que permitirá aos cientistas entender melhor como os cânceres se manifestam e desta forma preveni-los e até mesmo curá-los, explica a pesquisadora francesa.
Entendendo as mutações

Mas o aparecimento da doença ainda possa ser, em muitos casos, aleatório. “Apesar do câncer ser uma doença genética, relacionada, na maior parte dos casos, à uma mutação do DNA, sabemos que essas mutações hoje não são suficientes para desencadear a doença. "Existem células normais, que nunca se tornarão cancerígenas, e que têm mutações no DNA. "Também há outros elementos, ambientais ou próprios ao indivíduo, que fazem com que a célula que sofreu essa mutação se torne cancerígena."
A cientista francesa cita como exemplo infecções virais ou uma inflamação, que podem ter repercussões celulares que levem ao aparecimento do câncer. O tabagismo, o consumo de álcool e o sedentarismo são alguns dos fatores de risco ambientais conhecidos e alvo de recomendações oficiais.
Estudos também apontam que a poluição tem um papel preponderante no desenvolvimento de um câncer. O ritmo circadiano, o relógio biológico que coordena as funções fisiológicas quando dormimos ou estamos acordados, também atua na comunicação entre as células, inclusive cancerígenas.
"No futuro, será essencial para a prevenção saber quais são os fatores de risco individuais, ligados ao seu DNA e à sua história pessoal e familiar, e aqueles associados ao meio ambiente e outros fatores externos”, conclui a pesquisadora.
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