Diretora exibe filme sobre o pai, fundador do 'Nós do Morro', no Festival de Documentários de Paris
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Depois de duas edições online, a 44ª edição do Cinéma du Réel (Cinema do Real) volta às salas de exibição de Paris. O festival de filmes documentários acontece de 11 a 20 de março no Centro Georges Pompidou, também conhecido como Beaubourg, e reúne 40 títulos franceses e estrangeiros inéditos na França. Entre eles, o primeiro curta-metragem da jovem cineasta brasileira Julia Menna Barreto, que conversou com a RFI na capital francesa.
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A programação do evento inclui: competição internacional, seleção francesa, documentário África, Paris Doc e a sessão Première Fenêtre, (primeira janela). Também chamada de documentário do amanhã, é nessa categoria, que reúne 14 curtas, que está inscrito “Et Il n’a plus rien dit” (E nada mais ele disse, em tradução livre), filme em que Julia Menna Barreto se debruça sobre as circunstâncias da morte do pai dela, José Frederico Pinheiro, em fevereiro de 2010, no Rio de Janeiro. Conhecido como Fred Pinheiro, ele era diretor e fundador do grupo de teatro "Nós do Morro", baseado na favela do Vidigal, na zona sul da cidade.
“Esse filme nasceu do meu projeto de mestrado aqui na França, na ENSAV - École Nationale Supérieure d’Audiovisuel - que fica em Toulouse. É uma pesquisa a partir dos documentos do inquérito policial da morte do meu pai, do atestado de óbito e dos objetos que foram encontrados com ele no dia da morte”, explica a diretora.
O caso, que chamou muita atenção à época, até hoje não foi resolvido. O corpo, apresentando um corte profundo no pescoço, foi encontrado numa cabine de segurança usada pela Guarda Municipal na Floresta da Tijuca. De acordo com a polícia, Pinheiro teve a garganta cortada por um estilete que foi deixado no local.
Narrado em primeira pessoa pela própria cineasta, o filme tem vários momentos de silêncio e de escuridão, uma tentativa da autora de preencher as lacunas que não foram respondidas pela investigação policial. “Eu tentei traduzir de alguma forma, através dessa linguagem audiovisual, a estranheza e a violência dessa morte”, diz. “É um caso até hoje sem solução, a polícia nunca resolveu esse mistério, que foi arquivado como não conclusivo. A polícia fez diversas insinuações de suicídio ao longo desse processo”, completa.
Contra-investigação
O roteiro é uma espécie de contra-investigação. “Há diversos elementos que apontam que ele não poderia ter cometido suicídio da forma como aconteceu”, observa Julia Menna Barreto. “É muito estranho que dez páginas da agenda dele haviam sido arrancadas, justamente do período em que ele foi morto“, acrescenta ela sobre os mistérios que até hoje cercam o caso, arquivado como inconclusivo e repleto de insinuações não-oficiais de suicídio. “É uma maneira de dar um contorno a essa história. Nesse tempo, eu vivi o luto, eu sinto falta do meu pai todos os dias, é uma ausência muito grande”, lamenta. “Mas falar disso sempre foi uma dificuldade e poder mostrar [o filme] para outras pessoas é um presente, poder conversar com quem está por perto”, diz
O curta-metragem de 18 minutos foi realizado durante o primeiro ano do programa Master Recherche-Expérimentation que Julia frequenta na ENSAV, no sul da França. Os filmes foram selecionados por um grupo de alunos, em associação com a comissão de seleção e a direção artística do festival e podem ser vistos gratuitamente no site Mediapart, onde o público também pode votar no seu filme favorito.
“Eu fiquei muito feliz com essa seleção. Eu inscrevi o filme no festival para aproveitar a chance, mas confesso que não esperava este retorno”, diz a estudante. “É muito gratificante porque foi um processo muito difícil, mas é bom estar em contato com essa história para entender a fundo o que aconteceu”, diz a brasileira que já havia morado em Grenoble, na França. “Eu já tinha feito um intercâmbio em Grenoble, durante seis meses, e um pouco antes da pandemia eu apliquei para voltar para França para fazer um mestrado. É muito importante mostrar esse filme no país que acolheu este projeto”, conclui.
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